domingo, 14 de abril de 2013

Avô

 Perdi a conta às vezes em que vi-te a entrar numa ambulância e às vezes que fui visitar-te ao hospital. Perdi a conta às vezes em que disseram que estavas mal e eu acreditei sempre com todas as minhas forças que voltavas a casa. Voltaste sempre, sempre. Cada vez pior, foste perdendo a noção do mundo e das coisas mas pelo menos voltaste. Já não jogas comigo à bola nem ensinas-me a multiplicar, apenas reconheces o meu rosto mas dás-me sempre um nome novo. A tua memória vai-se apagando a pouco e pouco. Quando recebi aquela chamada percebi que algo estava mal, cheguei a casa e disseram-me que tinhas sido internado de novo. Desde há uns tempos para cá os médicos dizem-nos para nos irmos preparando para a fatalidade inevitável. Eu finjo que não oiço e acredito que voltas sempre. Por mais que os médicos digam que está cada vez mais próximo, eu vou estar à espera de ti, que chegues a casa. Eu vou continuar a chegar a casa e gritar por ti, correndo desenfreadamente pelo corredor até chegar ao teu quarto, depois encho-te o rosto de beijos e dou-te um abraço, enquanto tento que acertes no meu nome se estiveres num dia bom ou aconchego-te e deixo-te em paz se estiveres num dia mau. Porque tu prometes-te que irias ver-me "tornar doutora" e eu espero que consigas cumprir a tua promessa. Por isso tudo, vou continuar a acreditar. 

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